PEC dos Precatórios: entenda por que a medida é chamada de “PEC do calote”

A PEC dos Precatórios permite o adiamento dos pagamento de precatórios. A medida é uma manobra do governo federal para conseguir arcar com o Auxilio Brasil. Entenda a polêmica.

Escrito por Júlia Ennes

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A PEC dos Precatórios foi aprovada, na última terça-feira, 09, em segundo turno pela Câmara dos Deputados. A Proposta de Emenda à Constituição permite o parcelamento de precatórios e altera o cálculo do teto de gastos, liberando R$ 91,6 bilhões para o Orçamento do próximo ano. A medida é a solução do governo para abrir espaço no orçamento de 2022 e custear o Auxílio Brasil.

Precatórios são as dívidas que a União, Estados ou Municípios devem pagar a pessoas físicas e jurídicas, após decisões judiciais finais que não cabem mais recursos. Na prática, a PEC permite o adiamento e parcelamento dessas dívidas.

A proposta teve 323 votos a favor e 172 contra, uma margem mais folgada do que os 312 do primeiro turno. O texto passa agora pelo Senado, onde o presidente Jair Bolsonaro prevê dificuldades. Se aprovado pelo Senado, a medida passa pela sanção presidencial. 

O iDinheiro conversou com especialistas para entender melhor a polêmica da PEC dos Precatórios e quais serão os impactos, caso ela seja aprovada. Confira a seguir.

O que prevê a PEC dos Precatórios?

A PEC dos Precatórios é uma medida propõe uma série de mudanças na contabilidade do governo federal. A medida é uma manobra do Governo Federal para conseguir espaço no orçamento para os pagamentos do programa Auxilio Brasil, sem furar o teto de gastos. 

Com isso, o governo espera abrir um espaço de R$ 91,6 bilhões. Essa quantia será levantada da seguinte forma:

  • R$ 44,6 bilhões decorrentes do limite a ser estipulado para o pagamento das dívidas judiciais do governo federal (precatórios);
  • R$ 47 bilhões gerados pela mudança no fator de correção do teto de gastos, incluída na mesma PEC.

Como vimos, precatórios são pagamentos que o governo precisa fazer para quem ganhou processo judicial contra algum órgão público. A PEC vem causando polêmica justamente por permitir esse “calote” em parte da população.

Leia também: O que significa furar o teto de gastos?

O que muda com a PEC dos Precatórios?

A PEC dos Precatórios define o valor de despesas anuais com precatórios, corrige seus valores exclusivamente pela taxa Selic e muda a forma de calcular o teto de gastos. Sendo assim, a medida altera o regime de pagamento dos precatórios federais, estaduais e municipais.

O mestre em Direito do Estado e em Direito Tributário, Eduardo Natal, explica que para essa viabilização, o texto estabelece ainda, por 20 anos, um teto para o cumprimento de ordens judiciais de pagamentos (os precatórios). Para o próximo ano, esse novo teto deverá ser equivalente à variação do IPCA acumulado com as despesas pagas em 2016.

Com isso, a PEC causará uma demora ainda maior no recebimento dos pagamentos daqueles que ganharam causas contra algum órgão público. “Isso altera sensivelmente o regime de pagamento dos precatórios mediante a criação de novas modalidades de parcelamentos, depósitos e compensações. Isso favorece o alongamento da dívida pública em face dos seus credores”, afirma Natal.

Alexsandro Nishimura, economista, head de conteúdo e sócio da BRA, explica que a medida prevê ainda prioridade para pagamentos de valores até 60 salários mínimos, no caso da União, que seriam pagos integralmente. Assim, o credor que possui direito a receber valores acima da prioridade, teria o recebimento condicionado ao teto estabelecido a cada ano no Orçamento.

“As dívidas de maior valor, acima de R$ 66 milhões, seriam as mais afetadas, devido ao parcelamento, no qual poderão ser pagas em dez parcelas, sendo 15% à vista e o restante em parcelas anuais”, explica Nishimura.

Em nota, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) afirmou que a medida “é a sexta tentativa de calote, agora repaginada”. A nota ainda continua dizendo que “o texto aprovado prevê alterações já declaradas inconstitucionais pelo STF anteriormente. O índice eleito não recompõe o poder aquisitivo da moeda, caracterizando violação à isonomia diante da utilização, pelo Poder Público, da taxa Selic para os seus créditos”.

Calote? Pedalada? Quais são os problemas da PEC?

A PEC do Precatórios acabou ficando conhecida como “PEC do Calote”, por permitir que o governo adie o pagamento de dívidas judiciais. Por isso, a medida é vista como uma espécie de calote ou pedalada por alguns analiastas, como o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, afirmou em entrevista à Reuters. 

Pedalada é um termo popular para os casos de descumprimentos pelo Poder Executivo dos limites legais do manejo das obrigações orçamentárias. Sendo assim, a comparação das pedaladas fiscais se dá porque a PEC posterga o pagamento de uma despesa obrigatória. No entanto, Alexsandro Nishimura destaca que a diferença é que, no caso da PEC, o governo tenta postergar os pagamentos via mudança constitucional, previamente, com aval do Congresso

Para Eduardo Natal, a PEC pode ser considerada um exemplo de pedalada, por permitir um “calote legal” no pagamento dos precatórios. “Com a aprovação de uma PEC, os limites orçamentários seriam alterados e a prorrogação do cumprimento das obrigações orçamentárias estariam acobertadas pela legalidade. Seria um ‘calote legal’”, explica Natal. 

PEC dos Precatórios ainda desagrada mercado, mas reação deve ser menor, segundo especialistas

No primeiro turno de votação da PEC na Câmara, o Ibovespa fechou a sessão em queda de 2,09%, e o dólar teve alta de 0,35%, encerrando a R$ 5,60 na venda. No entanto, na última quarta-feira (10), o Ibovespa fechou com alta de 0,41%, após a aprovação da PEC dos Precatórios.

Para Natal, a reação do mercado agora com a possível aprovação é abrandada, porque os futuros resultados das contas públicas tenderiam a melhorar. “Entretanto, ocorrerá evidente prejuízo institucional e jurídico com a aprovação dessa PEC, pois os credores de precatórios serão muito prejudicados com a postergação dos pagamentos”, ressalva Natal.

Para Nishimura, o mercado enxerga a aprovação da PEC dos Precatórios como “dos males, o menor”. Isso porque, segundo ele, o mercado já percebeu que a ala política deseja e precisa da ampliação dos gastos -e que ganhou da ala econômica nesse embate. 

“O mundo ideal era o que se mantinha o arcabouço original do Teto de Gastos. Mas é melhor do que uma alternativa, que seria utilizada somente em caso de não aprovação da PEC e ainda mais mal vista pelo mercado, que seria o decreto de calamidade pública, permitindo o benefício com créditos extraordinários e fora do teto”, afirma.

Existem outras alternativas melhores para custear o Auxílio Brasil?

O Ministério da Cidadania afirma que para cumprir o planejamento do Auxílio Brasil – que promete ser uma versão turbinada do extinto Bolsa Família – o ideal seria que o Congresso aprovasse a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios até o fim de novembro. Mas, diante da polêmica que a medida vem causando, será que existe outra solução?

Antônio Carlos de Freitas Júnior, professor de Direito Constitucional e advogado sócio do Escritório A.C. Freitas Advogados, compara a organização orçamentária do Estado ao planejamento financeiro de uma família. Ele destaca ainda que retirar dinheiro do pagamento dos precatórios é uma escolha política

“Há outras despesas que poderiam ser suprimidas para compensar as necessidades do Auxílio Brasil. Da mesma forma que um pai e uma mãe de família organizam seu orçamento cortando um gasto daqui outro gasto de lá, há a óbvia alternativa do orçamento público ser repensado como um todo, com os cortes em áreas e estruturas de devam ser despriorizadas diante da necessidade do Auxiliou Brasil”, explica o advogado. 

Ainda segundo Freitas Júnior, a grande questão da PEC é quanto ao cálculo do teto de gastos, que pode criar problemas econômicos. Isso porque, a justificativa do governo para a PEC é a necessidade de achar fundos para o Auxílio Brasil. No entanto, a medida libera mais recursos que o necessário para ampliar o Bolsa Família.

“O Estado gastar mais do que pode é o caminho para inflação e outros males. A melhor solução sempre foi um verdadeiro ajuste fiscal com maior racionalização e eficientização dos gastos públicos. O resto é remendo, como essa PEC”, afirma.

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